A Revolução Constituinte de 1932, também conhecida como Revolução de 1932 e Guerra Paulista, foi um movimento armado que durou quase três meses no Estado de São Paulo. O objetivo do movimento era a derrubada do Governo Provisório de Getúlio Vargas e a promulgação de uma nova Constituição.
Para melhor compreensão dessa revolução é necessário voltarmos alguns anos no tempo, mais precisamente no início do século XX. Naquela época o Brasil vivia em pleno crescimento econômico decorrente do acelerado processo de industrialização e dos lucros obtidos nas lavouras de café, quase predominantes em São Paulo e Minas Gerais. Por conta dessa intensa contribuição dos estados paulista e mineiro, foi criado a política café com leite, que alternava os governantes entre políticos de Minas Gerais e de São Paulo, que eram os estados mais ricos e populosos do país.
No ano de 1929, era a vez de um governante mineiro ser indicado, mas Washington Luís rompeu com a política café com leite naquele ano ao indicar o paulista Júlio Prestes. Dezessete estados apoiaram a indicação de Júlio Prestes a presidência e com isso, Minas Gerais rompe com São Paulo e une-se a bancada gaúcha no Congresso Nacional prometendo apoio a Getúlio Vargas, caso este viesse a se candidatar a presidência do país.
Em setembro daquele mesmo ano, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraíba lançaram Getúlio Vargas como candidato a presidência. O partido democrático de São Paulo, juntamente com parte da classe média paulista e os tenentes também apoiavam Getúlio. Naquele mesmo mesmo, já era nítida a possibilidade de uma revolução, pois na Câmara do Deputados e no Senado Federal já se diziam que se a Aliança Liberal não vencesse as eleições, uma revolução aconteceria.
Em 1º de março de 1930, Júlio Prestes é eleito presidente do Brasil com 91% dos votos, mas não chegou a tomar posse do cargo. O candidato João Pessoa, que era vice de Getúlio Vargas foi assassinado e a Aliança Liberal usa sua morte como um estopim para começar uma revolta armada. Dizem que o assassinado de Pessoa não tinha ligações políticas, mas ainda assim, foi essa a válvula de escape escolhida para iniciar uma luta sangrenta no estado.
Em 3 de outubro de 1930 os rebeldes dominam os estados de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraíba, rumando para a capital do país. Vinte e um dias depois, um golpe militar liderado por comandantes militares do Estado do Rio de Janeiro depõem Washington Luís do poder e entrega o Estado nas mãos de Getúlio Vargas em 3 de novembro de 1930, colocando fim a supremacia dos governos de São Paulo e Minas Gerais.
Getúlio suspendeu a Constituição e nomeou interventores de sua confiança para todos os estados, exceto para Minas Gerais, que encabeçou a sua candidatura a presidência. Esse fato reforçou o conflito entre paulistas e mineiros. O governo provisório de Vargas impôs medidas para controlar sindicatos e as relações trabalhistas, criando instituições para intervir no setor agrícola como forma de enfraquecer os estados. O clima de revolta, mas sem instauração oficial de um movimento durou por quase dois anos.
Em 1932, a insatisfação dos paulistas não foi saciada com a indicação de um governador paulista ao estado, pois este não possuía autonomia para governar, pois sofria intervenções do governo federal. O primeiro passo para o movimento foi um mega comício realizado com cerca de duzentas mil pessoas na região da Praça da Sé, marco zero da capital paulista.
Em fevereiro de 1932, o Partido Republicano Paulista e o Partido Democrático se uniram, criando a Frente Única a fim de exigir o fim da ditadura de Vargas e a criação de uma Constituição Federal. A partir dai, a maior parte dos paulistas apoiavam a revolução que estava prestes a eclodir.
Em meio a movimentos, passeatas e reclamações, cinco pessoas foram mortas por partidários da ditadura em 23 de maio de 1932, fato que deu origem ao movimento MMDC, sigla com a primeira letra do sobrenome dos jovens assassinados.
Em 9 de julho de 1932 eclodiu oficialmente a revolução constituinte com o apoio da frente única do Estado do Rio Grande do Sul e do extinto Estado de Maracaju. No Estado de São Paulo houve grande contingente de voluntários civis e militares para combater o governo de Vargas. Cerca de 200 mil pessoas se voluntariaram, sendo que destes, 60 mil combateram o exército constitucionalista. São Paulo esperava o apoio do interventor do Rio Grande do Sul, que era o estado mais bem armado do país, mas de última hora e por pressão de Getúlio, este decidiu enviar tropas a capital paulista para combater o movimento juntamente com o governo federal.
Com a eclosão da guerra paulista, uma multidão sai às ruas. Tropas paulistas são espalhadas para os fronts de todo o estado. As tropas federais eram mais numerosas e assim o governo entrou em guerra avassaladora contra São Paulo. Aviões eram usados para bombardear cidades do interior paulista. Cerca de quarenta mil homens paulistas enfrentaram o contingente de cem mil soldados federais.
Assim como o Rio Grande do Sul, Minas Gerais foi compelido por Vargas a permanecer do lado da ditadura, deixando assim São Paulo sozinho em meio a uma guerra armada, contando apenas com algumas poucas tropas mato grossenses contra o restante de todo o Brasil. As tropas paulistas se viram em luta em três grandes frentes: O Leste Paulista, O Sul Paulista e o Vale do Paraíba.
As fronteiras do estado foram fechadas e dessa forma não havia como obter armamento fora do país. Muitos voluntários usavam suas armas pessoais para lutar. Engenheiros do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) e da Escola Politécnica do Estado (EPU-SP) começaram a desenvolver armas para suprir as tropas. Um navio americano que trazia armamento para os paulistas foi apreendido pela Marinha do Brasil.
Uma das armas mais sofisticadas feitas nesse período pela indústria paulista foi o trem blindado, que foi usado na campanha militar no Vale do Paraíba. O Estado de São Paulo criou uma moeda própria, sendo esta falsificada pela ditadura e distribuída para desestabilizar a economia do estado. Em meio a escassez de munição, os paulistas utilizavam um aparelho chamado "catraca" que imitava o som das metralhadoras, a fim de afastar os soldados ditatoriais.
Muitos se mobilizaram pela luta de São Paulo, inclusive através de programas de Rádio, com destaque especial para César Ladeira da Rádio Record. O governo de Vargas acusava São Paulo de estar nas mãos do fascismo italiano trazido pelos milhares de imigrantes que vieram para o país para trabalhar nas lavouras de café. Brasileiros de diferentes partes do país eram compulsoriamente convidados a combater o Estado de São Paulo, sob a justificativa de que o estado queria se separar do Brasil.
Dentre os milhares de mortos no movimento, o crime que mais chocou o país durante a revolução foi a do assassinato do agricultor Paulo Virgínio na cidade de Cunha. Ele se recusou a dizer onde as tropas paulistas estavam e como punição foi obrigado a cavar a própria sepultura e morreu dizendo: "Morro, mas São Paulo vence!"
Paulo Virgínio foi homenageado anos após a sua morte, onde seu nome foi dado a rodovia SP-171 que liga São Paulo a região do Vale do Paraíba, onde o agricultor foi executado.
Houve conflitos separatistas dentro da direção da revolução, pois parte do grupo queria a independência de São Paulo como um Estado livre, tornando-se uma república soberana ou a criação de uma federação onde os estados possam adquirir soberania (situação que ocorre nos Estados Unidos com seus vários estados autonômos). Dentre esses defensores do separatismo paulista, temos destaque especial para o escritor Monteiro Lobato.
Em 4 de outubro de 1932, a revolução constituinte tem um fim com a rendição de São Paulo, após as tentativas de invasão ao estado, falta de armamentos, economia precária e com a Polícia Militar abandonando a guerra. O governo federal estimou um total de 934 mortos, mas estimativas não oficiais da época computaram cerca de 2200 mortos, além de destruição em parte de diversas cidades do interior paulista.
São Paulo voltou a ser governado por paulistas pouco tempo depois e uma nova constituição foi prometida por Vargas, quando este, posteriormente, consegue se manter no poder para o mandato do governo constitucionalista, promulgando a nova constituição prometida em 1934.
Desde 1997 a data de início da revolução passou a ser feriado no Estado de São Paulo, sendo esta a data cívica mais importante para os paulistas e este o maior movimento cívico de sua história. Essa foi a primeira revolta contra o governo de Getúlio Vargas e o último conflito armado entre governo federal e um estado no país.
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Sobre o Autor
Syl é jornalista, pianista, apaixonada por carros e artes (em especial a primeira e a sétima) e muitas outras coisas. Nas horas vagas compartilha conhecimento no fantástico mundo da bloguesfera. Siga @SylOficial
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