Ah, os trotes. Parecem tão interessantes quando
somos crianças e tão naturais quando crescemos que nem percebemos do que são
capazes. Nesse fim de semana, um líder religioso faleceu. Até ai, sem muitas
objeções, ao menos que fosse assassinado. Mas ele morreu depois de receber uma
ligação, onde o covarde do outro
lado da linha informava que havia sequestrado suas duas filhas. Nervoso e
surpreendido por uma notícia que nunca esperou ouvir, começou a passar mal, sendo
levado ao hospital, mas não resistindo após sofrer uma parada cardíaca.
Detalhe: suas filhas nunca foram sequestradas!
Sabe o que consegue ser ainda mais nojento do
que uma vida ceifada por conta de uma brincadeira de mal gosto? É saber que
isso não é crime no Brasil! É isso mesmo, eu posso ligar na sua casa e destruir
seu casamento dizendo que sou uma amante, inventar que alguém é bandido, te
ameaçar ou inventar que sequestrei seus filhos. Afinal, eu não cometi crime,
pois foi só uma “brincadeirinha”.
O Código Penal brasileiro, que foi feito na
década de 40, prevê tipo penal para trote telefônico apenas na hipótese de
alguém “perturbar ou interromper o
serviço telefônico, telegráfico ou rádio telegráfico, impedindo ou
dificultando o seu restabelecimento (Artigo 266 do CP). No caso de trotes
para a polícia, o mesmo constitui falsa comunicação de crime. A pena para a
única hipótese de crime de trote é de 1 a 3 anos e multa, sendo que raramente alguém
conseguirá o “milagre” de cumprir tal pena recluso, uma vez que existem
diversas alternativas preliminares antes de se chegar a prisão, até porque o
crime é de menor potencial.
Mas nada diz que se alguém inventar uma mentira
que venha a resultar em danos psicológicos, físicos, familiares ou morais via
trote, intitula-se crime, mesmo sabendo-se que isso é mais comum do que se poderia
imaginar há setenta anos atrás. Isso mostra o quanto nosso Código Penal e de
Processo Penal está ultrapassado e não condiz com a realidade e evolução da
sociedade como um todo. O crime evoluiu junto com a tecnologia e ignorar isso é
dar um tiro no pé.
Independentemente de você ter uma religião ou
não, pare para pensar: alguém merece ser morto dessa maneira? Quem garante que
seu pai não vai enfartar se alguém fizer uma brincadeira dessas? Quem garante
que sua esposa ou namorada não vai se desesperar e começar a depositar dinheiro
na conta do bandido para ter “você” de volta após um trote desses? É possível
que as pessoas digam: “Ah, mas como acreditar! Falam tanto disso na TV.”,
também falam para economizar água e as pessoas continuam lavando calçadas,
morando em um cortiço alugado, mas comprando seus carros de segunda mão para
estacionar em frente à casa dos outros e esbanjarem água os lavando nos finais
de semana. Também falam na TV para não deixar água parada, mas as pessoas
deixam, ficam com dengue e culpam o prefeito. NAa TV também orientam os
cidadãos ao voto consciente, mas as pessoas vão as urnas (quando vão), fazem
tudo errado e passam quatro anos “gemendo”.
É lamentável que as pessoas lamentem cinquenta
centavos a mais na passagem do transporte público e não consigam fazer uma
emenda popular, não consigam ler uma normativa e interpretá-la corretamente. É
lamentável como muitas pessoas são “Maria vai com as outras” generalizando
situações que os outros falaram ou demonstraram de maneira obtusa e que eles
não tem certeza.
Quantas pessoas mais deverão morrer para que
haja mudanças nas leis? Exagero? Então “tá”. Tome cuidado porque qualquer dia
desses, esses mesmos colegas do DDD 61, 65, 81, 77 e 85 que dizem que você
ganhou um prêmio milionário através de torpedos, podem ligar na sua casa e
talvez não seja você a atender.
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Sobre a Autora do Artigo
Syl é jornalista, pianista, apaixonada por carros e artes (em especial a primeira e a sétima) e muitas outras coisas. Nas horas vagas compartilha conhecimento no fantástico mundo da bloguesfera.
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