Muitas
pessoas pecam pela própria ignorância opcional ao deixar de comunicar um crime,
acreditando que justiça nunca será feita, bem como outras lavram um boletim de
ocorrência e passam o resto da vida dizendo que “ninguém” quis fazer nada à
respeito, quando na verdade era preciso uma manifestação favorável da vítima
para que fosse aberto um processo. Nas próximas linhas, conheceremos de forma
sucinta as formas de ações penais existentes no Brasil e como cada uma delas
funcionam.
Existem
crimes que a vítima não precisa representar para que seja ajuizada uma ação pelo Ministério Público e
correr atrás de uma solução ou punição para o criminoso. Esses crimes são todos
os que afetam a segurança, economia ou bem estar do coletivo, ou seja, da
sociedade. Exemplo: Homicídio. Você não precisa ir até a delegacia e dizer que
quer que o assassino seja preso, tão pouco ficar quieto e dizer que não quer
acusar alguém de tentar matá-la(o). O homicídio consumando ou tentado é um
crime contra a vida, logo, o Ministério Público não precisa de autorização da vítima
para prosseguir com um processo criminal contra o réu. Basta ter o conhecimento
do fato criminoso que sua inércia termina e inicia-se a persecução penal.
Também se enquadram nessa forma de incondicionalidade para iniciar o processo,
o roubo, o sequestro, o tráfico de drogas, a pedofilia, o estupro, entre
outros. Lembrando: sempre que ferir ou tentar ferir o direito, vida ou
integridade física de outras pessoas além da vítima, cabe ao Estado iniciar a
investigação independente do consentimento do ofendido.
Algumas
ações são condicionadas a representação da vítima, ou seja, a manifestação de
interesse em iniciar uma ação penal contra o criminoso. Esses crimes são
aqueles que são de alguma forma graves, mas que ferem apenas a vítima ou aqueles
que estão vivendo com ela, sendo assim, ela precisa representar dentro do
prazo. Exemplo: ameaça. Uma pessoa ameaça a outra de morte, seja isoladamente
ou repetidamente (comum em casos de separação). Se a pessoa quer que seja
instaurado um processo contra o indivíduo que pratica as ameaças, ela deve
informar na delegacia que quer representar, só lavrar o boletim de ocorrência
gera apenas um registro, mas não uma investigação e desejo de sanar uma lide.
Outro exemplo: divulgação de segredo (pessoal ou comercial que venha a causar
algum tipo de prejuízo), crime contra o presidente da república ou chefe do
governo (governador, ministro, etc), assédio sexual, perigo de contagio (alguém
com AIDS sair dormindo com várias pessoas propositalmente – caso mais comum do
que se imagina), entre outros. Todos são crimes, mas o direito do coletivo não
foi ameaçado, só dos envolvidos, logo a ação é condicionada a representação da
vítima ou de seu representante (pais quando menor de idade, tutor, herdeiro no
caso de pais interditados, etc).
Por fim,
existe a ação penal privada, ou seja: Para a vítima arguir a ação será
necessário que ela constitua um advogado e inicie a persecução por conta
própria (claro que dentro da justiça, possuindo o estado como intermediário). A
ação penal privada se inicia após uma queixa crime e não denúncia, como nas
anteriores. Os crimes são de menor potencial ofensivo, como os de injuria
racial, difamação, calúnia, etc. Ou seja, são crimes previstos em lei, mas que
não ferem ninguém fisicamente, mas se vitima desejar, pode processar quem
inventou algo à seu respeito ou lhe atribuiu características do qual não
gostou. Para isso, terá de contratar um advogado e arcar com as despesas do
processo, assim como em uma ação civil. Dificilmente existirá uma sentença com
prisão para esses tipos de crimes, embora possa estar previsto na normativa em
vigência. Costuma-se haver uma indenização (quando solicitada na petição
inicial de uma ação civil) e/ou algum tipo de acordo ou multa junto ao Estado,
uma vez que não há sentido em colocar atrás das grades uma pessoa que chamou a
outra de feia, macaco, gorda ou inventou algo a seu respeito, mas nem por isso
precisa passar impune, por isso a justiça apresenta penas bem brandas, caso
contrário, na haveria cadeia disponível para todo mundo. Imagine se todo mundo
fosse preso por xingar alguém em algum momento da vida? O Brasil seria uma
cadeia gigante a céu aberto.
Vale
ressaltar que haviam muitos casos de mulheres espancadas que enchiam a mão de
boletins de ocorrência para dizer que a justiça nunca fez nada. Outras eram
mortas pelos companheiros e seus parentes diziam o mesmo. Tenha em mente que
nenhum policial, escrivão ou delegado tem a obrigação de dar uma aula de
processo penal para cada pessoa que adentra um DP, se o fizerem, é de total e
livre espontaneidade, mas isso não é comum acontecer, até porque são muitas
pessoas que passam por uma delegacia diariamente. Depois de imagens de
segurança de um salão de beleza vazarem na imprensa mostrando uma cabeleireira
sendo assassinada em seu ambiente de trabalho pelo próprio ex marido, do qual
não aceitava a separação, a justiça decidiu que violência doméstica e familiar
é uma ação penal pública incondicionada, preservando assim a vida das
vítimas que se arrependem de lavrar boletim de ocorrência e voltam a sofrer
ameaças e agressões de seus ex companheiros. Apenas as lesões leves é que devem
ser de ação penal condicionada a representação da vítima. Uma vez ajuizada a
ação penal incondicionada, não é possível a sua desistência.
Portanto, antes de reclamar que algum infrator do jurídico está impune, verifique se o direito lesado foi o seu ou do coletivo. Ainda que seja comunicado um crime de ação penal em uma delegacia, o MP é inerte para iniciar persecução sem que você deixe bem claro à autoridade policial que deseja representar. A representação funciona como uma autorização que a vítima concede ao Estado e se você não autorizar, os dados do fato delituoso servirão apenas para quadros estatísticos. Vale salientar que se você não denunciar, até mesmo as ações incondicionadas ficam impossibilitadas de serem executadas. O Estado precisa saber do crime para puni-lo, caso contrário, será como se o tipo penal nunca tivesse ocorrido.
Syl é jornalista, pianista, apaixonada por carros e artes (em especial a primeira e a sétima) e muitas outras coisas. Nas horas vagas compartilha conhecimento no fantástico mundo da bloguesfera.
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